FIV – Vírus da Imunodeficiência Felina

27 agosto 2014, 10:34. Postado por Resgatinhos

Tigrão: FIV+, lindo e cheio de disposição

Apesar de ser comum vermos as siglas FIV/FeLV juntas, essas são doenças causadas por dois vírus distintos, e nesse post iremos falar exclusivamente do FIV. É um post longo porque o assunto é complexo, e por isso mesmo é muito importante se informar.

Um dos diagnósticos mais temidos por qualquer tutor de gatos, a contaminação pelo FIV (em inglês, Feline Immunodeficiency Virus) torna o gato susceptível a uma série de problemas de saúde que, em sua fase terminal, caracterizam a síndrome conhecida como AIDS felina.

A doença foi descoberta em 1986 quando os gatos de um gatil começaram a apresentar sinais de doenças associadas com a imunodeficiência, semelhantes aos sintomas apresentados por humanos com o vírus HIV. Hoje, o FIV é encontrado em gatos em todo o mundo, e calcula-se que de 2 a 4 por cento dos 83 milhões de gatos vivendo nos EUA apresentam a doença. Não temos estatísticas para o Brasil.

Não há ‘cura’, não há vacina comprovadamente eficiente, mas gatos infectados que recebem cuidados médicos e são mantidos em ambientes livres de stress, dentro de casa, podem viver por muitos meses e até muitos anos antes que a doença atinja os seus estágios crônicos.

Quais são os sintomas?

Os sintomas causados pelo FIV são associados às reações imunossupressoras do vírus nas células de defesa do organismo. Após a infecção inicial, a contagem de glóbulos brancos começa a cair, causando um dano progressivo ao sistema imunológico do animal. Muitos gatos permanecem no estágio assintomático por muitos anos.

Em sua fase inicial, os sintomas caracterizam-se por:

    • febre
    • aumento dos gânglios linfáticos
    • aumento da susceptibilidade às infecções intestinais e cutâneas

por um período de 4 a 6 semanas após o contágio. Animais jovens ou com um sistema imunológico competente podem apresentar a fase latente ou subclínica, na qual não se observam sinais da doença durante anos. Com o passar do tempo e o avanço da idade, os gatos contaminados tendem a apresentar um severo comprometimento de seu sistema imunológico, tornando-se susceptíveis a uma grande variedade de infecções crônicas.

Importante: mesmo que assintomático (não apresenta sinais clínicos da doença), um gato contaminado pode transmitir o vírus para outros gatos.

Os sinais clínicos do FIV podem apresentar 5 estágios distintos:

1 – Fase aguda: inicia-se de 4 a 6 semanas após a infecção com o desenvolvimento de:

    • febre
    • leucopenia (redução do nº de leucócitos no sangue)
    • esplenomegalia (aumento do volume do baço)
    • hepatomelaglia (aumento do volume do fígado)

Os anticorpos contra FIV só começam a ser produzidos pelo sistema imunológico cerca de 3 a 6 semanas após o contágio e tornam-se detectáveis por teste a partir de 4 a 8 semanas. Portanto, se o seu gato saiu ontem de casa e voltou hoje cheio de marcas de brigas/mordidas, não adianta sair correndo para fazer o teste, é necessário aguardar pelo menos 2 meses.

2 – Fase subclínica: animal geralmente sem sintomas, pode permanecer assim por meses ou até anos.

3 – Fase clínica: gatos podem apresentar

    • linfoadenopatia generalizada (aumento dos gânglios)
    • febre
    • inapetência
    • perda de peso

4 – Fase crônica: com manifestações secundárias, como o desenvolvimento de:

    • lesões da cavidade oral (por ex. gengivite)
    • infecção no trato respiratório
    • febre
    • diarréia
    • alterações hematológicas (anemia, linfopenia (diminuição do nº de linfócitos), neutropenia (diminuição do nº de neutrófilos), e trombocitopenia (redução do nº de plaquetas no sangue)
    • neoplasias (tumor e câncer)
    • alterações neurológicas

5 – Fase terminal: devido à extrema debilidade do organismo, não têm controle sobre as infecções secundárias e podem desenvolver doenças sistêmicas severas (falência renal, hepática, pancreática ou linfoma).

Como o vírus é transmitido?

A principal forma de contágio é através da mordida, do tipo que ocorre principalmente nas ruas durante brigas agressivas e disputas territoriais entre os gatos, e também através do contato sexual durante a cópula. Esse é mais um excelente motivo para manter seu gato dentro de casa, livre do risco de contaminação! Um modo de transmissão menos comum é da mãe para os filhotes por via placentária ou através da amamentação, se forem infectadas antes ou durante a gestação. A contaminação através de compartilhamento de potinhos de água/comida, caixinha de areia, lambidas, espirros, etc não é comum.

Se você tem um gato FIV+, o risco dos outros gatos da casa se contaminarem é baixo, a não ser que os gatos briguem entre si (a mordida violenta sendo o principal meio de contágio). O vírus não sobrevive por muito tempo no ambiente, e é facilmente inativado pelo calor ou por desinfetantes domésticos e detergentes comuns, sem necessidade de utilização de vazio sanitário prolongado. No entanto, a saliva contém grandes quantidades de vírus, portanto, e apesar de alguns profissionais da área alegarem que não há problema um animal FIV+ conviver com outros não infectados, o risco de contaminação, mesmo sendo baixo, existe. É uma roleta russa, e depende do tutor pesar os riscos. Nós, particularmente, recomendamos que o gato FIV+ viva separado dos outros. 

Quais gatos têm mais chance de contaminação?

Gatos não castrados e que brigam com mais frequência por território/fêmeas são os que apresentam uma maior chance de contaminação, mas qualquer gato que tenha acesso à rua, independente de ser macho ou fêmea, castrado ou não, está exposto ao risco de contaminação. As chances de gatos que ficam dentro de casa se contaminarem são praticamente inexistentes, eles teriam que ser mordidos por algum animal infectado para que isso acontecesse (por um novo gato trazido para dentro de casa, por exemplo, e que não tenha sido testado).

Humanos podem se contaminar com o FIV?

Não. Esse vírus não é transmitido de gatos para humanos, tampouco de gatos para cães ou outros animais. Somente de gatos para gatos.

Como é feito o diagnóstico?

O diagnóstico não é tão simples assim, preto no branco. Existe sim um “teste para FIV/FeLV”, mas se houver qualquer dúvida quanto ao resultado, principalmente se for positivo, o ideal é que ele seja combinado a uma série de outros testes e observações do quadro clínico do animal, pois a chance de um ‘falso positivo’ existe, e acontece com muito mais frequência do que gostaríamos de ver.

Inicialmente, deve-se fazer uma combinação de testes sorológicos, qualitativos ou confirmatórios, através de diferentes técnicas (ELISA, RIFI, PCR, Western Blot) a partir de amostras sanguíneas para a detecção de anticorpos contra FIV e também do vírus da FeLV.

Caso o resultado seja positivo, SEMPRE repita o exame depois de 90 dias, e se for o caso acrescente os seguintes exames complementares:

    • Hemograma completo: para avaliação das desordens hematológicas
    • Eletroforese de proteínas: para o estudo das respostas imunológicas
    • Análise citológica de linfonodos, aumento de volumes e líquidos cavitários: para identificação de atividade linfocitária e desenvolvimento de neoplasias
    • Citologia de medula óssea: para caracterização de doenças mieloproliferativas
    • Ultrassonografia abdominal: para identificação de lingoadenomegalia, hepatomegalia e esplenomegalia

Todo esse cuidado é importante porque não é incomum vermos gatos serem diagnosticados como FIV e/ou FeLV positivos, e testes posteriores mostrarem que foi um ‘falso positivo’. Isso pode acontecer por uma série de fatores, inclusive material contaminado dentro do próprio laboratório (ou kit de teste). Gatos FIV+ são estigmatizados na hora da adoção, e sua chance de encontrar um lar é drasticamente diminuída, portanto é essencial que o resultado positivo seja (re)confirmado.

Qual o tratamento para FIV?

Infelizmente, não há um tratamento antiviral específico para FIV. Geralmente são utilizadas as mesmas drogas da linha humana, como o AZT e outros fármacos antivirais, mas os efeitos colaterais são consideráveis e não há uma sobrevida significativa do paciente.

O gato pode ser portador do vírus por um longo período antes que os sintomas apareçam. Portanto, o tratamento se concentra principalmente em estender o período assintomático ou, caso os sintomas apareçam, em suavizar os efeitos secundários do vírus. O seu veterinário pode prescrever alguns dos seguintes tratamentos:

    • medicação para infecções secundárias
    • uma dieta saudável e palatável para encorajar uma boa nutrição
    • terapia de reposição de fluidos e eletrólitos
    • anti-inflamatórios
    • medicação para fortalecer o sistema imunológico
    • controle parasitário

Há como prevenir?

A melhor maneira de evitar que o seu gato contraia o vírus é mantê-lo dentro de casa, sem qualquer possibilidade de contato com algum outro gato infectado. Se o seu gato for ficar hospedado em um hotelzinho ou clínica veterinária, em contato direto com outros felinos, exija que todos os animais seja testados para FIV. Além disso, qualquer gato, comprado ou adotado, deve ser testado antes de entrar na sua casa. Abrigos e gatis são locais com acentuada disseminação da doença devido ao convívio forçado de vários animais em um único ambiente. Colônias de gatos também apresentam uma maior incidência de contaminação entre seus membros, ao contrário de gatos que vivem na rua mas mais isolados, evitando o convívio com outros felinos.

Uma vacina foi desenvolvida, mas sua eficácia contra todas as cepas do vírus ainda precisa ser determinada, e além disso ela não está disponível no Brasil. A chave para combater a disseminação dessas infecções é identificar os gatos infectados e prevenir que eles entrem em contato com animais sadios.

Meu gato é FIV+, que cuidados ele necessita?

    • Mantenha o seu gato exclusivamente dentro de casa (inclusive fora do quintal/jardim, mesmo que protegido da rua). Isso irá prevenir que ele entre em contato com agentes causadores de doenças aos quais ele possa estar susceptível. Mantendo o seu gato dentro de casa, você também está protegendo os gatos da vizinhança de serem contaminados.
    • Observe qualquer alteração, por menor que seja, na saúde e comportamento do seu gato. Comunique imediatamente ao seu veterinário qualquer preocupação que você tenha.
    • Leve o seu gato ao veterinário para um check-up pelo menos 2 vezes por ano, incluindo exames de sangue e urina.
    • Ofereça ao seu gato uma ração de excelente qualidade – nada de dietas cruas, por favor, uma vez que as bactérias e parasitas em carne e ovos não cozidos podem ser perigosas para gatos com o sistema imunológico comprometido.
    • Castre o seu gato.

E O MAIS IMPORTANTE: se o seu gato testou positivo para FIV, não considere isso como uma sentença de morte. Antes de mais nada, refaça os exames depois de 3 meses (preferivelmente em um outro laboratório), pois existe sim a possibilidade de ser um falso-positivo. Se o resultado se confirmar, lembre-se que muitos animais infectados vivem por anos e anos sem apresentar sintomas, levando uma vida feliz e relativamente saudável, para a qual você pode contribuir oferecendo ao seu gato todos os cuidados necessários.

Fique à vontade para compartilhar os nossos textos, mas se for reproduzi-los em sua totalidade ou mesmo em parte, por favor mencione a fonte e coloque o link de redirecionamento.

RESSALVA: Pessoal, nós não somos veterinárias, e não podemos prescrever tratamentos ou medicamentos, muito menos online. Além disso, muitas vezes não conseguimos ler as mensagens todos os dias, então pedidos ‘urgentes’ perdem a razão de ser. Se o seu gatinho estiver apresentando qualquer tipo de problema de saúde, a primeira providência SEMPRE é levá-lo a um veterinário qualificado.


Fontes:
http://www.vin.com.mainpub/feline/aafpfivdx.htm
http://www.aspca.org/pet-care/cat-care/feline-immunodeficiency-virus-fiv
http://www.catvets.com/cat-owners/disease-and-conditions/fiv
http://www.icatcare.org/advice-centre/cat-health/feline-immunodeficiency-virus-frequently-asked-questions
 
Tradução e adaptação: Resgatinhos
Consultoria: Dr. Manoel Oliva Proença Netto, médico veterinário
Fotos e imagens tiradas da Internet, exceto pela foto do gato Tigrão, que foi resgatado por nós.

11 Responses to FIV – Vírus da Imunodeficiência Felina

  1. O Tigrão é lindo e muito carente. :)

  2. Tenho 85 gatos, todos adotados. Apesar de viver em uma grande propriedade onde eles são muito felizes vivendo em liberdade, problemas de saúde e mortes por aids felina são relativamente frequentes. Desejo saber se gatos idosos são tão suscetíveis quanto os bem jovens?

    • oi Jaqueline, animais muito jovens e animais idosos tem mais chance de contrair qualquer tipo de doença, pois em um o sistema imunológico ainda não está totalmente formado, e no outro a própria idade vai enfraquecendo o organismo.

  3. Leucopenia= queda dos glóbulos brancos. Não aumento…

  4. Como gateiro que sou, parabenizo-os pelo excelente artigo. Claro, direto e em linguagem accessível.

  5. eu gostaria de saber se essa doença é transmissível para as pessoas;caso elas estejam machucadas e forem lambidas por um gato já doente ?

    • olá Guilherme, não há perigo, esse vírus é transmitido exclusivamente para outros felinos. Obviamente que o ideal é que se a pessoa tiver um machucado, não deixe o gato lamber, não pelo vírus da FIV mas por uma série de outras bactérias presentes na saliva do animal.

  6. Excelente matéria!!! Parabéns!!! Tenho dois gatos e essa matéria me foi muito útil!!!

  7. Olá! Gostaria de saber de a FIV e FELV pode ser transmitida para um cachorro que convive com um gato contaminado?

    • ola Thiago, não, FIV e FeLV são transmitidas exclusivamente de gato para gato, nenhum outro animal.