“Parabéns, você está grávida de 2 meses! Só tem um senão: você não está imune à toxoplasmose e se quiser ter uma gravidez bem sucedida deve desfazer-se do seu cão e do seu gato.”
Certamente que estas palavras infelizmente tão repetidas nos consultórios médicos já foram ouvidas por centenas de mulheres, cujo coração ficou dividido entre o bem estar do filho tão desejado e o dos seus queridos animais de estimação.
Há motivos para tanta preocupação? Deve a mulher grávida automaticamente dar o seu cão ou gato quando engravida? Devemos acreditar em tudo o que lemos, especialmente na imprensa destinada à leitoras do sexo feminino?
É incrível que, em pleno século XXI, tantos médicos e auxiliares de saúde estejam tão mal informados acerca da gravidez e dos gatos. Vamos aqui desmistificar isto de uma vez por todas, e verificar que NÃO É NECESSÁRIO LIVRAR-SE DO GATO QUANDO ESTÁ GRÁVIDA, tal como a maioria dos médicos aconselha.
A toxoplasmose pode ocorrer em diversos mamíferos que ingiram carne crua, especialmente através da caça que esteja infectada com o protozoário chamado Toxoplasma gondii. Este parasita unicelular tem um ciclo de vida um pouco complicado. Sabe-se que tem de passar por um hospedeiro intermediário e por um definitivo, que é sempre o gato e APENAS O GATO, NÃO O CÃO! O toxoplasma só consegue produzir oocistos infectantes no intestino do gato. O cão não transmite toxoplasmose coisa nenhuma! Que isto fique bem claro. (a não ser que você coma a carne de cão, irk!)
O ser humano serve portanto de hospedeiro intermediário. Nele o parasita enquista nos músculos ou outras partes do organismo. Mas esta infecção é geralmente assintomática. Muitas pessoas podem contrair toxoplasmose e não se aperceber disso, mas caso tenham sintomas estes podem ser febre baixa, dores musculares, aumento do volume dos gânglios linfáticos, perda de apetite e dores de garganta.
Uma vez exposto à doença, o ser humano desenvolve imunidade contra o parasita e raramente torna a adoecer com toxoplasmose. Isto é confirmado através de uma análise sangüínea que revelará que a pessoa é soropositiva em relação a esta doença. A mulher grávida soropositiva já teve a doença e por isso já não há risco para o feto. Apenas grupos de risco, tais como as pessoas que padecem de AIDS ou outra situação que deprima o seu sistema imunológico (pessoas que fizeram recentemente algum transplante) estão em risco de adoecer novamente e de maneira grave (pneumonias ou doenças neurológicas).
Mas o caso se complica se a mulher grávida não é soropositiva quando engravida. Neste caso ela não deve contrair toxoplasmose pela 1ª vez durante os primeiros 3 meses de gravidez (após este período os riscos são significativamente menores). Pegar toxoplasmose durante o 1º trimestre de gravidez equivale ao risco do bebê nascer com graves deformações neurológicas ou mesmo retardamento mental.
Vemos porque há tanto pânico…mas de alguma forma exagerado. Vamos ver o porquê. Se a leitora possui um gato já há algum tempo, que vive exclusivamente dentro de casa, e que jamais come carne crua, você NÃO está em risco. De fato está cientificamente provado que manusear carne crua ou trabalhar em jardinagem sem luvas é mais arriscado do que fazer carinho no seu gato.
Os gatos contraem toxoplasmose ao comer carne crua ou caça (por ex. ratos) que contenha algum dos 3 estados infectantes deste parasita. Neste caso os gatos excretarão pelas fezes oocistos infectantes de 3 a 10 dias após a ingestão de tecidos infectados. Esta excreção pode durar até 14 dias após a 1ª exposição do gato ao parasita. MAS APÓS ESSE PERÍODO É POUCO PROVÁVEL QUE O GATO EXCRETE DE NOVO, pois tal como os humanos, o gato desenvolve imunidade contra o toxoplasma. Os oocistos excretados nas fezes transformam-se em infectantes apenas 1 a 4 dias após a excreção, e podem permanecer assim no meio ambiente por vários meses. Se você tirar as fezes do gato diariamente da caixa de areia, especialmente se usar luvas, bem vê que o risco de contrair toxoplasmose é mínimo!
Normalmente os felinos não exibem sintoma de toxoplasmose. Todavia os gatos infectados e que inadvertidamente contraem alguma doença imunossupressora (FIV ou FELV) podem adoecer gravemente com sintomas variados: letargia, depressão, febre, diarréia, pneumonia, hepatite, uveíte (inflamação ocular grave) ou mesmo doenças neurológicas.
Existem muitas maneiras de minimizar o risco de contrair toxoplasmose. Cozinhe muito bem a carne pelo menos 15 a 20 minutos antes de a consumir. Tanto as carnes de vaca como o porco podem transmitir a doença se consumidas cruas ou mal cozidas. O leite não pasteurizado de vaca, cabra ou ovelha também pode conter oocistos. Mantenha o seu gato exclusivamente dentro de casa, não permita que ele consuma o que caça nem lhe forneça carne crua. Alimente-o com rações comerciais apropriadas.
Alguns médicos aconselham as grávidas a testar o seu gato para ver se é soropositivo ou não. Acho contraproducente até porque se der positivo, o gato pode já estar imune à doença, e já nem estar na fase de eliminação dos oocistos. Ou seja: pode já ter contraído a doença há anos e agora já não constituir perigo nenhum. A má interpretação do teste pode condenar um gato que a priori pode não constituir perigo nenhum. Se o teste dá negativo, então melhor ainda! Não dê nada cru ao seu gato e não se preocupe mais com o assunto. O que interessa no fim de tudo é se a mulher grávida é imune ou não. Se não é, deve ser um pouco mais cuidadosa no primeiro trimestre de gravidez.
A toxoplasmose não é o único perigo que as grávidas têm de enfrentar. Se houver boa higiene, e consumo de carne apenas bem cozida, a maioria dos problemas será evitada. A toxoplasmose não é nenhuma novidade e as mulheres grávidas não devem temer possuir gatos. A companhia e a devoção que os felinos nos dedicam ultrapassa em muito o risco de nos expormos a doenças. Todavia, se restam algumas dúvidas não hesite em contactar-nos ou o médico veterinário do seu companheiro felino. Estime-o, não o abandone!
Cuidados para evitar contrair toxoplasmose:
- Use luvas de borracha e lave bem as suas mãos após fazer jardinagem. A forma infectante do parasita pode viver por longos períodos de tempo na sujidade e areia onde os gatos defecam.
- Coloque luvas e lave e esvazie a caixa de areia do gato diariamente para os oocistos não terem a oportunidade de se tornarem infectantes.
- Consuma carne sempre bem cozida, nunca mal passada, e lave muito bem as suas mãos após manipular carne e vegetais crus.
- Beba leite pasteurizado, nunca cru.
- Não alimente os gatos com carne crua ou parcialmente cozida, vísceras ou ossos, e não permita que saiam de casa para evitar o hábito da caça.
- Combata os vetores mecânicos (baratas e outros insetos).
- Lave bem as mãos após entrar em contato com qualquer gato.
- Verifique através de análise sangüínea se é soropositiva ou não. Se der positivo, não tem nada que se preocupar.
Fonte: Sofia Marques, médica veterinária – Arcadenoe.pet
Fique à vontade para compartilhar os nossos textos, mas se for reproduzi-los em sua totalidade ou mesmo em parte, por favor mencione a fonte e coloque o link de redirecionamento.